22/09/11

Ensina-me a viver sem ti

Aprende-se a viver com isto. Como uma doença crónica ou um defeito de nascença. Aprende-se a viver com isto, a deixar de contabilizar as horas e os minutos...lembras-te quando calculávamos até à exaustão o tempo que faltava para cairmos nos braços um do outro, e tu só dizias...está quase...e eu respondia...e hoje já não conta!
Aprende-se a viver com isto, a deixar de adormecer pela manhã, embalada pelo chilrear dos pássaros madrugadores...o ritual era conhecido...aninhávamo-nos um no outro...eu puxava as tuas mãos para junto do meu peito...e por fim adormecíamos.
Aprende-se a viver com isto, a relembrar as músicas que ouvíamos juntos...e contigo a trautear uma ou outra letra em inglês, achava-te piada. Aprende-se a viver com isto, com a falta das tuas mãos nas minhas, de sentir cada bocadinho de ti...da tua pele macia e dos teus ossos sempre à espreita. Aprende-se a viver com isto, a tua voz ensonada pela manhã, a sms de bons dias, e o sorriso alegre que me  faziam sentir a miuda mais feliz do mundo, embora a quilómetros de distância...Ensina-me agora a viver sem ti...sem o teu cheiro, sem os teus olhos cintilantes, sem a tua energia, sem o entusiasmo com que te entregas em tudo o que fazes...sem a nossa cumplicidade e sem a nossa alegria! Diz-me que estás feliz e te sentes completo, totalmente preenchido por quem habita em ti.Que te sentes desejado e amado...Não quero aprender a viver sem ti...

21/09/11

Fico

 Fico à tua espera, mesmo sabendo que não vens. Sei que não vens, mas mesmo assim fico. Ainda te lembrarás de mim? Fico. Não me perguntem nada, não me macem, deixem-me ficar apenas. Fico à mercê das palavras que escreveste, dos sorrisos que esboçaste e das noites em que nos amávamos em frente à lareira. Fico. Fico à janela deste cigarro, único farol de mim. Desde que saíste eu nunca mais fui a mesma. Quando cheguei e não estavas não me encontrei. Procurei-me e procurei-me mas em vão. Não sei de mim, onde me terei guardado, onde me terei metido. Não sei de mim. Se calhar levaste-me. Procura recordar-te, vê se te lembras. É importante para mim. Faço-te falta. Pensa bem. Tenta recordar-te. Contigo levaste aquela gargalhada aberta, que tão bem me fazia. Procura bem nos bolsos do casaco. No bolso de trás das calças onde eu me metia quando passeávamos pela rua agarrados. Procura-me bem no teu peito, pelas vezes que nele adormeci. Procura-me no teu olhar. Não é outra senão eu quem ainda vês, sentada na cadeira da cozinha com os pés pousados nas tuas pernas. Não voltas eu sei, mas ao menos devolve-me, ainda me tens?

12/09/11

História da princesa moura e do dragão azul

 

"Esta é a história de uma princesa moura das terras quentes do sul
e de um dragão azul - que era afinal um príncipe das terras altas do norte
Andava a princesa desaustinada, numa noite de temporal e absolut vodka, num reino que ficava equidistante
(Ela não sabia do que andava à procura.)
Entrou na sua carruagem puxada por noventa cavalos e tinha apenas percorrido alguns metros quando se lhe atravessou no caminho um jovem dragão azul com figura de príncipe, molhado como um pinto por causa da chuva que caía muito forte. Ela parou, baixou o vidro da carruagem, e ele quis saber que música vinha ela a ouvir e para onde ia ela àquela hora da madrugada.
Logo aí a moura percebeu que era um dragão azul das terras altas do norte que lhe falava a sorrir, e foi sem ela se dar conta que ele a raptou, convidando-a para sua casa...
Ainda se perderam, porque o belo dragão ainda não sabia de cor o caminho de casa.
Mas a princesa deixou-se levar até ao castelo, feliz por acreditar que o dragão não lhe iria fazer mal - quem sabe seria um príncipe? (Parecia mesmo um príncipe que ela já tinha visto num filme!...)
Encontraram-se numa noite de temporal entre o norte e o sul
e foi ela que o guiou sem saber que estava a ser raptada.
Quando chegaram ao castelo o príncipe abriu a porta devagar e entraram os dois pé ante pé, pois todos se encontravam já a dormir.
Os aposentos continuavam mergulhados na penumbra da madrugada e a princesa moura ficou a saber que no castelo não havia luz nem água, e por isso foi preciso acender uma vela.
Conversaram de música e cinema durante um bocadinho, mas o dragão dentro do príncipe começou a beijar a moura, que estava cheia de medo.
(Não é todos os dias que uma moura é raptada por um dragão azul das terras altas do norte!...)
E cheia de medo ela se foi entregando devagarinho até deixar de ser princesa, para se transformar numa sereia nos braços do belo príncipe...
Abraçaram-se muito, beijaram-se muito, mas ela temia que o dragão fosse apenas mais um sapo, e lá se ia protegendo como podia, dando muito mas não tudo.
Queria sossegá-lo, ao príncipe, mas o dragão não queria sossegar...
E foi preciso muito carinho e ternura e paciência para adormecer o príncipe e o dragão dentro dele...
Depois a sereia procurou peça a peça as suas roupas espalhadas pelo chão e foi-se vestindo devagar e sem barulho, para não o acordar.
Ela apagou a vela, tapou o príncipe adormecido e beijou-o docemente na face. Ele sorriu, sem abrir os olhos.
E a moura disse "Até logo".
Encantada."
por Pedro Paixão